A complexidade dos temas de políticas públicas em nossos dias força um novo olhar sobre grandes problemas. Mudanças climáticas, saúde, educação, direitos humanos em suas mais distintas nuances – todas são questões difíceis, mas que começam a ser abordadas de formas inovadoras. Em lugar do tradicional enfoque diretivo (top­down), a massificação do acesso a tecnologia começa a viabilizar a criação de soluções de baixo para cima (bottom­up). Assim, os problemas globais serão resolvidos, no futuro, em nível municipal.

As cidades inteligentes (smart cities) já servem de parâmetro para formas mais racionais e eficientes de gestão de grandes aglomerações humanas. Nas grandes cidades, projetos inovadores que trazem em si o gérmen da sustentabilidade impactam positivamente os contextos urbanos onde são operados. A mobilidade urbana nos grandes centros, um problema tão estrutural quanto pedagógico, há muito está no cerne dos debates envolvendo as cidades e a atuação dos agentes públicos.

A verdade é que estrutura moderna das grandes cidades cresceu em detrimento da qualidade de vida da população. Na região metropolitana de São Paulo, os engarrafamentos chegam a mais de 300 km, fazendo cidadãos perderem uma media diária de 2h56 no trânsito e causando à indústria local prejuízos com combustível extra e tempo ocioso na ordem de R$ 69,4 bilhões. Isto é o equivalente a 7.8% do PIB da região.

Isso sem falar de questões de saúde causadas pelo stress e pela poluição ou dos reflexos na segurança pública. O melhoramento da mobilidade urbana é uma necessidade que demanda uma readequação cultural. Sua concretização se assenta sobre a revisão das estruturas, o incentivo a novos modais de transporte mais sustentáveis e a economia do compartilhamento.

Melhorar as condições de mobilidade significa realizar uma transição, conduzir uma mudança gradual e segura. Neste contexto, o poder público desempenha papel fundamental. Não apenas no sentido de ser operador dessa mudança cultural, provendo as ferramentas para que a transformação aconteça. Mas no âmbito de ser o organizador das regras do jogo, líder em um processo de revalidação do ambiente urbano. O novo modelo econômico é o que privilegia o acesso em detrimento da propriedade. A diminuição do consumo em favor da otimização do uso dos recursos.

O impacto da economia da inovação e do compartilhamento sobre a mobilidade urbana é inquestionável. A análise e o processamento de dados têm ajudado no planejamento urbano e na construção de cidades mais inteligentes. O incentivo ao transporte público, com exclusividade de faixas, é axiomático. A sustentabilidade é outra premissa fundamental, concretizada, por exemplo, na primazia de transportes não­-motorizados e na construção de ciclovias e ciclo­faixas. O compartilhamento vêm a reboque, como um complemento. A transição não será uma revolução imediata, mas uma mudança de forma orgânica. A realidade fática do compartilhamento é a transição para um momento posterior de reacomodação cultural.

A verdadeira cidade inteligente é aquela que permite aos cidadãos a reapropriação dos espaços públicos. A tecnologia e a inovação, no contexto de cidades cada vez mais complexas, pode ser o vetor para se atingir este fim.

Fonte: Brasil Post por Daniel Mangabeira / Advogado e diretor de políticas públicas da Uber no Brasil